A editora Boitempo, claramente identificada com o pensamento de esquerda, vem sendo alvo de ataques por parte de veículos da mídia conservadora. Certos jornalistas não entendem, e seus chefes não toleram, uma editora que sobrevive e cresce com um catálogo coerente e de qualidade, não pautado pela tábula rasa do mercado.
Um exemplo é a publicação do explendidamente escrito O ano I da Revolução Russa, que coincide com o aniversário de noventa anos da revolução soviética. Escrito pelo jornalista e revolucionário belga Victor Serge, é um vibrante e engajado relato da revolução que mudou os rumos da história mundial. Os antecedentes, a luta e os conflitos revolucionários, a relação entre o Partido Bolchevique e o povo russo, a tomada de poder pelos sovietes, todos esses eventos são narrados por Serge poucos anos após terem acontecido. Publicado em 1930, impressiona a abordagem completa feita por Serge dos vários aspectos do período entre 7 de novembro de 1917 e 7 de novembro de 1918. As batalhas, os debates políticos, os desafios de organização econômica e militar (como o abastecimento das cidades e a montagem do Exército Vermelho) e perfis dos principais líderes da revolução (Lenin e Trotski, entre outros) dão vida à aventura revolucionária empreendida nove décadas atrás. Dos conflitos armados até questões prosaicas, como o alcoolismo entre as tropas, Serge se desdobra para, a partir da vida cotidiana, das decisões políticas e dos conflitos de classe, registrar a experiência da primeira revolução comunista bem-sucedida no mundo. Para melhor situar o leitor, a edição da Boitempo traz uma cronologia da revolução de 1917, e um glossário que explica e contextualiza os termos usados por Serge no livro. O ano I da Revolução Russa é o relato da odisséia real da construção de uma nova sociedade, narrado com uma combinação de rigor, riqueza de dados e um grande entusiasmo pela aventura de mudar o mundo. Leia a apresentação do livro escrita por David Renton (arquivo pdf): O marxismo dissidente de Victor Serge no site da própria Boitempo.
Vale muito a pena também ler a entrevista de Ivana Jinkings, concedida a Arturo Hartmann, do site do Instituto da Cultura Árabe (Icarabe). Ivana, paraense, filha do saudoso comunista Raimundo Jinkings, define sua editora como “independente, comprometida com a qualidade dos textos que publica e com o desenvolvimento da cultura e do pensamento crítico”. Ela fala, com propriedade, das dificuldades de manter uma editora pequena que foca sua atenção em obras de pensamento crítico em tempos de grandes editoras e campanhas publicitárias de massa.