quarta-feira, outubro 29, 2008

Em defesa do rádio

Amarildo Augusto*

Em seu livro "O rádio na era da informação - teoria e prática do novo radiojornalismo", o jornalista Eduardo Meditsch diz que o rádio é um veículo que oferece proximidade e intimidade, portanto, verosimilhança. Credibilidade.
Pesquisa do Instituto Ipsos Marplan, especializado em mídia, mostra isso com clareza. Os números revelam que, para 54% dos entrevistados, a televisão é um veículo em que eles podem confiar. O rádio é confiável para 75% das pessoas ouvidas.
Meditsch também lembra que dez pessoas podem ouvir, juntas, uma mesma mensagem radiofônica, mas ela será apreendida individualmente. Tudo depende da forma como a mente de cada uma delas é capaz de decodificar a mensagem que está sendo transmitida. Aquilo que é informado por intermédio do veículo rádio, defende o autor, tem mais condições de permanecer gravado na memória do ouvinte porque exige dele uma participação efetiva e ativa. Por isso o rádio é interativo.
O rádio talvez seja o mais democrático meio de comunicação. Quem não tem em sua casa ao menos um aparelho de rádio? Pelo menos 99% dos lares brasileiros recebem as ondas curtas, médias ou de freqüência modulada das centenas de emissoras espalhadas pelo País. Comparando com o custo de um computador, fica fácil perceber qual dos dois é mais acessível economicamente. E nem estamos falando de veículos e escritórios, onde a presença do aparelho radiofônico é quase absoluta.
Pequeno, e de certa forma simples, o aparelho transmissor acompanha o ouvinte onde quer que ele esteja: no banheiro é possível ouvir rádio. No campo, também. Nos estádios de futebol. O rádio é companheiro de muitos. E grande parte é fiel a essa amizade. Outra vez a mesma pesquisa Ipsos Marplan mostra que as pessoas que ouvem rádio ficam sintonizadas entre três horas e meia a quatro horas por dia. E que um mesmo ouvinte permanece em média 45 minutos ligado na mesma emissora.
Embora não seja visto com os mesmos bons olhos pelo mercado publicitário, o poder de penetração do veículo é indiscutível. A comparação entre rádio e televisão é quase injusta, do ponto de vista das vantagens que um e outro oferecem aos anunciantes:

As pessoas passam mais tempo ouvindo o rádio do que televisão

Para convencer o consumidor o comercial tem que ser visto ou ouvido várias vezes ao dia. E as pessoas ouvem mais rádio que vêem TV. Sem contar o fato de que as pessoas absorvem o que ouvem (palavras) com mais facilidade do que o que assistem (imagens), principalmente quando a mensagem estiver em forma de jingle.

O rádio é imbatível durante o horário comercial

O rádio tem o triplo da audiência da televisão durante a manhã e mais que o dobro durante a tarde. Note que o rádio é imbatível justamente no horário em que as empresas e o comércio estão abertos, fazendo dele mídia obrigatória para quem quer efetuar uma venda. A TV só tem boa audiência à noite, quando o comércio está fechado e o cliente, em casa.

O rádio chega aonde a TV não vai

O rádio é o único veículo que atinge o consumidor em qualquer lugar: começando o dia com o rádio-relógio, como companhia no café da manhã, no ônibus e no carro, a caminho do trabalho, no restaurante ou na lanchonete, na praia, na fazenda, no cooper e na bicicleta com o walkman, ao lado enquanto navega na internet. Enfim, o rádio é o único veículo que tem um público exclusivo, enorme e pronto para receber uma mensagem.

O horário nobre do rádio dura 13 horas. O da TV, só três

O rádio é imbatível das 6 horas da manhã até às 19 horas. A TV alcança seu pico entre 19 e 22 horas. São quatro vezes mais eficiência a favor do rádio. E com um custo 15 vezes menor.

Um comercial de rádio pode mudar em menos de uma hora. Na TV isso não funciona assim

Um bom comercial de rádio pode ser produzido e estar no ar em menos de uma hora, enquanto na TV requer mais de um dia e a boa vontade da emissora. Não é à toa que vemos tantos comerciais "de Natal" sendo veiculados na TV após 25 de dezembro, coisa que não acontece no rádio porque nele o comercial já mudou na madrugada do dia 26.

Uma produção de alto nível no rádio custa 95% menos

Você pode usar dez helicópteros, 20 carros de Fórmula 1, uma fábrica inteira e milhares de pessoas em um comercial de rádio gastando quase nada e em prazo recorde. Isto porque o rádio usa a imaginação do consumidor, ao invés de usar o seu bolso. Tente fazer a mesma cena na televisão e ela se transforma em uma superprodução de alguns milhares de dólares e meses de filmagem. Além disso, quando você mostra uma "bela imagem" na TV, ela pode ou não agradar o consumidor. Mas se você diz a ele, no rádio, que ali está uma "bela paisagem", ele imagina a paisagem de seus sonhos.

Anunciar em rádio custa 15 vezes menos que na tevê

Não é necessário fazer comentários. Mesmo com todas estas vantagens, o mercado praticamente ignora o rádio. Citando novamente a pesquisa Ipsos Marplan, 60,4% das verbas publicitárias do País são direcionadas para a televisão. Outros 23,4% vão para os jornais. As revistas ficam com 8,9% desse bolo, enquanto 1,3% ficam com a mídia externa. Para o rádio vão apenas 4% dos recursos publicitários. É muito pouco para um potencial tão grande.
O jornalismo no meio do rádio é um caso a parte. Grandes emissoras, como a CBN (Central Brasileira de Notícias), Globo, Bandeirantes, Jovem Pan, para ficar apenas entre as paulistas, investem pesado em radiojornalismo. São, na maioria, seu carro chefe e compromisso com o ouvinte. Nessas emissoras, a independência financeira e a isenção política lhes permitem exercer um jornalismo sério, apartidário, sem rabo preso.
Embora, seja necessário lembrar que a corrente de analistas que vê o veículo hoje "correndo atrás" da tevê e das agências de notícias, essas emissoras vêm cumprindo bem o papel a que se dispuseram: informar a sociedade.
O mesmo não se pode dizer, com boas exceções, das emissoras menores, do interior do Estado e do País. A isenção do poder público, o distanciamento necessário para crítica construtiva, seu papel simultâneo de formador de opinião e porta voz da sociedade nem sempre estão no nível desejado. A dependência financeira das prefeituras e câmaras municipais impede que esse papel seja exercido a contento. Não por responsabilidade dos profissionais de radiojornalismo, mas pelos compromissos comerciais, muitas das vezes motivados por interesses menos nobres, outras por uma mera questão de sobrevivência.
Em que pese todas as dificuldades e vantagens, para o profissional que opta por se aventurar no veículo rádio, resta saber uma última face do poder do rádio: sua capacidade de seduzir o profissional. Por todas as suas características e desafios o rádio é apaixonante. Informar o ouvinte de viva voz, instantaneamente; receber o retorno quase que imediato dos ouvintes, entre outras emoções, não têm preço. É preciso estar preparado para enfrentar esse desafio, mas também é preciso saber que ele vale a pena.


*Amarildo Augusto, é repórter e produtor de rádio.