terça-feira, julho 04, 2006

Bússola profissional

Na Vanguarda, agência que fundei em 1991, seguimos diretrizes. Cotejadas aqui e ali, copiadas descaradamente de fontes anônimas ou não, elas não são nossas no sentido de terem sido criadas e inventadas aqui. São produtos da observação e da assimilação graduais de diferentes fontes, como a propaganda e a cultura também o são.
Mas essas diretrizes têm nos valido de barricada dia após dia nesses 15 anos de estrada e de batalhas.
Todos podem reescrever algumas delas ou acrescentar outras diretrizes, mas lembre-se que apenas a experiência dirá se a nova regra terá validade suficiente para ser mais um saco de areia em nossa barricada.

1. Tenha um ídolo.
Uma pessoa, um conceito, uma campanha que você admira. Mas tenha um ídolo, uma referência. Uma celebridade não é um ídolo. Da celebridade você quer a imagem, do ídolo você quer o exemplo. Os ídolos são ícones, marcam a sua vida. As celebridades passam, em seu desfile interminável de futilidades. Um ídolo mostra que podemos ser eternos. Uma celebridade mostra que podemos ser efêmeros. Tenho um ídolo, coloque seu poster na parede. E esqueça as celebridades.
2. Acredite em você.
Seja o melhor você que você puder ser. Um dia, você vai ser melhor que o seu ídolo. Almeje isso. Até porque, por melhor que seja, o seu ídolo ou referência pode ser tudo, mas jamais poderá ser você ou o resultado do trabalho que só você será capaz de fazer.
3. Acredite nas suas idéias mas as deixe viver.
Produzimos e vendemos idéias e, às vezes, nos apaixonamos por elas. Mas não a produzimos para serem nossas crias eternas e intocadas. Como os filhos, a fazemos para o mundo e no mundo, elas tomam o seu destino. Acredite: há clientes cruéis. Alguns não discutem. Mudam a criação e pronto. Se aceitarmos trabalhar com ele, aceitamos seus métodos e sua tirania. Mas se temos espaço, devemos lutar pelas idéias porque sabemos que todos “não” é assassino. Contudo, se por trás do “não” existir uma boa explicação ou raciocínio que convença você, você não tem mais um “não”. Você tem um novo briefing. E vai poder fazer melhor.
4. Seja uma esponja.
Absorva tudo, tudo, propaganda, tecnologia, sociologia, história em quadrinhos, grafite, clássicos, best-sellers, jornais, revistas, vídeos, políticos, antropólogos, música erudita, pagode, Freud e a sua vizinha, Tour D’Argent em Paris e o botequim pé-sujo da esquina, Umberto Eco e a sua empregada, Gore Vidal e Amaury Silveira, shopping center e padaria, supermercado e camelôs, hipermercados e internet.
5. Saiba ouvir.
Ouvir o cliente, ouvir o mercado, ouvir o consumidor, ouvir quem está a sua volta. Antes de dizer ao público o que ele precisa é preciso descobrir o que ele deseja. Mas depois de ouvir muito e absorver o que ouviu, quando todos estiverem falando da mesma coisa, ou pensando a mesma coisa, pense em outra.
6. Faça mais, mais, mais.
Sempre mais. Vista a camisa de cada produto, serviço ou problema. E sue muito esta camisa. Uma idéia sempre pode ser melhorada. Mesmo depois de pronta. Mesmo depois de veiculada. O que fez o brasileiro chorar a desclassificação do Brasil na Copa de 2006 não foi a derrota, mas a apatia do time. Mostre que você vai em dividida, que dá carrinho, que luta para que seu cliente vença. É para isso que ele nos paga.
7. Aprenda as regras da profissão.
Uma por uma, aprenda todas as regras. E, se for preciso, quebre todas. Mas depois de aprender, e se for preciso. Com conhecimento e consistência. E nunca esqueça que as regras da profissão são muitas vezes a sua maior arma.
8. Mergulhe no problema a ser resolvido.
E voe para fora dele. Mas nunca mergulhe tão fundo que não possa voltar. Nem voe tão alto que não possa descer. As soluções sempre estão dentro do problema e não fora dele. Mas às vezes é preciso sair dele para ver melhor.
9. Cuidado com o poder da publicidade.
A nossa profissão dá muitas vezes a sensação de poder. E o poder é poderosamente traiçoeiro. Recomenda-se o seu uso com alta dose de moderação. Mas, ao mesmo tempo, tenha sempre a certeza de que é o máximo trabalhar numa profissão que mexe com o coração, o fígado, a mente e as fantasias das pessoas.
10. Não seja gênio.
Ninguém, nem o gênio, consegue ser genial todo dia. O importante não é o brilho ofuscante ou o estrelismo de um dia. Mas a conduta, o caráter, a consistência, a qualidade média acima da média e ao longo do tempo. Não queira ser uma estrela, mas sim um planeta.
11. Trabalhe 24 horas por dia.
Se possível, invente a 25ª hora. A comunicação e a idéia não têm hora nem lugar para acontecer. Pode ser no escritório, em casa, na rua, no botequim, na praça ou no banheiro. E tenha uma relação de amor com o trabalho. Ninguém faz bem aquilo que não ama. Lembre-se também de que a relação com um cliente, qualquer cliente, é feita de mil e um detalhes, mas todos só serão construídos se houver um detalhe fundamental: confiança. Sem a confiança dos dois lados, nada dará certo. Finalmente, nunca se esqueça de que – mais do que criação – a nossa profissão é feita de inteligência. As pessoas e sua inteligência são o principal ativo de uma agência.
12. Seja honesto. Diga a verdade. Não há contra-indicações conhecidas para isso.