sexta-feira, maio 26, 2006

A arma do argumento

Aeroportos são espaços impessoais.
Lugares onde a individualidade dissolve-se em ações pré-fabricadas, mecânicas, rituais.Casas de transição para quem não quer estar ali.
Muita gente, como eu, busca nesse ambiente hostil um lugar seguro na leitura.
Isso talvez explique porque bancas e livrarias em aeroportos sejam negócios tão prósperos.
Foi em um desses atos de recolhimento que encontrei, em uma banca de um aeroporto qualquer, o livro “Televisionários” (Conrad Editores), relato cronológico das atividades de um grupo de heróicos e desvairados ativistas contra a guerra do Vietnã e contra o cerco direitista que varria todos os continentes na década de 70.
Ali, perdida, achei uma pérola. A frase “a partir daqui termina o desespero e começa a tática”, impressa em preto no papel branco, brilhava.
Lapidar, é do manifesto inaugural do grupo de ativistas alemães conhecido mundialmente como Baader-Meinhof, que incendiou, literalmente, o continente europeu.
Para os mais jovens, esse nome é apenas o título de uma das melhores canções da banda Legião Urbana. Para os mais velhos, sinaliza o início do enfrentamento da ordem instituída em um período onde fazer política de oposição era risco de vida e, via de regra, exigia trocar as armas dos argumentos pelos argumentos das armas.
Dirigido por Andréas Baader, outsider contestador, e Ulrich Meinhof, jornalista de esquerda convertida em ativista política, a Fração do Exército Vermelho (RAF) notabilizou-se, na década de 70 e início da década de 80 do século XX, por ações ousadas contra o Estado alemão e o grande capital, desencadeando aquilo que a imprensa e os órgãos de repressão de todo o mundo passaram a denominar “euro-terrorismo”.
Baader e Meinhof, presos e sob a proteção do estado alemão, foram assassinados a sangue frio.
Ele com um tiro na nuca, ela enforcada com um lençol amarrado na grade de sua cela. No laudo de ambos os corpos, a causa mortis foi grafada como “suicídio”. Quem é aqui o terrorista? Os mortos, vítimas indefesas sob a custódia da Justiça, ou os algozes, assassinos traiçoeiros encobertos pelas vestes do Estado?
Nos ataques que a RAF fez em década e meia de existência não havia alvos civis, apenas bases militares e CEOs de grandes corporações - "representantes do capital", “soldados graduados” do regime que Baader, Meinhof e seus companheiros combatiam com uma logística precária e coragem arrebatadora.
Por que colocar uma frase de uma dupla de prisioneiros políticos como dístico de abertura de meu blog sobre comunicação, marketing e política?
Porque ela sinaliza um ponto de passagem entre a inércia e a ação.
E é esse o objetivo desse blog.
Ser ponto de convergência para os que querem passar do desespero à tática, discutir, transgredir, debater, enfrentar temas como comunicação, marketing, política e artes sem meias palavras e duplos sentidos.
Um espaço aberto ao debate, onde cada um assume o peso das armas que quer carregar e atira na direção que desejar.
Sem sensores, nem senhores.
Porque a partir de agora termina o desespero e começa a tática.
Posso contar contigo?