sexta-feira, maio 09, 2008

Santarém, 7 de maio, 17:48h

Santarém é uma daquelas cidades que, como disse certa feita Oscar Niemeyer, tem alma de mulher. Uma persona com veias expostas ao céu e uma paixão de viver que vai das gentes aos peixes, das pedras às plantas e que transborda em profusas águas cor de anil. Santarém se desnuda ao amanhecer pálido e cálido, de leve brisa quente. Se veste para o dia e, novamente, se despe ao entardecer, quando uma luz difusa surge ao por do sol, conduzindo o entardecer a um longo, muito longo, slow motion que expõe os grãos da imagem, que estoura em cores impossíveis, surreais, que faz o amarelo queimado do sol banhar-nos com um tom vermelho improvável. E aí surge o azul. O lindo azul que vaza e banha tudo, com uma generosidade que quase nos engana, quase nos dá a impressão de despojamento, quando na verdade reserva para si a riqueza e a pompa das princesas. Santarém é uma pintura, um quadro, uma música, um gosto, uma noite, um dia, um jeito de ver e um bafejar de vida que nos faz dizer, sempre em voz baixa, como quem reza, o quanto é bom ter vivido para vê-la, para conhecê-la, para ser por ela recebido sempre com aquele calor que sai do chão e não do sol, fazendo ferver o sangue e as idéias. O que diria Neruda, o ouvires da palavra, se visse Santarém? Talvez fizesse um soneto apaixonado, talvez escrevesse mais uma canção desesperada ou, simplesmente, calasse e recitasse: se cada dia cai, dentro de cada noite,/ há um poço/ onde a claridade está presa./ Há que sentar-se na beira /do poço da sombra/e pescar luz caída/com paciência... O sol à pino sobre a testa, o azul das águas banhando a alma, fazendo da vertigem da vida a ode eterna a um lugar que tem alma de mulher.

____________

A imagem que ilustra este post foi feita por mim no dia 7 de maio de 2008, às 17:48, com um simples celular Sony Ericsson, câmera 2.0 mp auto focus e lente Carl Zeiss.