Não mantenho esse espaço para comentar propaganda. Como estou no ramo e tenho agência de publicidade - duas, aliás - seria um tanto tendencioso eu tratar do tema comentando o que outros fazem. Mas, meu deus do céu, como é ruim a propaganda das Casas Bahia, o maior anunciante de varejo do país.
Tradicionalmente, o grupo varejista aplica 3% do faturamento previsto para o mês seguinte, em marketing. No ano passado a empresa comprou R$ 713,169 milhões em mídia, segundo o raking Agências & Anunciantes. Em qualquer quadrante, é muito dinheiro. Então por que essa massa monetária não produz boas idéias e sim barulho e propaganda ruim?
A conta publicitária das Casas Bahia pertence à Y&R, uma das maiores agências do mundo cujo braço brasileiro pertence ao midiático multi-empresário Roberto Justos. O relacionamento entre o cliente e a agência data de 1999, quando então NewcommBates substituiu a house Interjob, responsável pela comunicação do grupo nos 20 anos anteriores. Quando o publicitário Silvio Matos deixou a presidência da agência e o comando da estrutura montada, a pedido das Casas Bahia, na sede da varejista em São Caetano do Sul (SP), o empresário Roberto Justus assumiu a linha de frente da operação e o contato direto com os Klein, dono da rede, até que novos profissionais fossem contatados para a linha de frente da conta. A WPP, sócia de Justus na Y&R, teria pressionando o astro televisivo e publicitário nas horas vagas a aumentar a rentabilidade na conta das Casas Bahia, já que, apesar dos altos volumes investidos, a operação seria pouco lucrativa para a agência por causa dos grandes descontos obtidos na negociação com os veículos. O que fez Justos? Radicalizou uma fórmula básica e barata de fazer comerciais de varejo: a gritaria baseada na repetição. Uma releitura de Goebbels para vender geladeiras, fogões e móveis horríveis.
A gritaria e a repetição, presentes na propaganda da rede, reproduz, sem mediação, a locução de uma camelô de rua. O tom é estridente. O visual é primário. O volume final é muito alto. Incomoda.
Você poderá dizer "incomoda, mas vende". Essa não é a questão aqui. Não me interessa se ele vende ou não. Não sou acionista da rede. Estou aqui fazendo uma discussão ética. Vale tudo para vender? Sim, eles vendem, mas o fazem ao custo de produzir ruído, de dar um mal exemplo conceitual ("Quer pagar quanto?", a Lei de Gerson dos dias de hoje), de gerar, em escala, a repetição desse modelo de comunicação de camelô em todo o país. Sim, porque esse modelo que move uma estrutura milionária de produção pode ser copiado por qualquer um que tenha um PC velho em casa e uma câmera 3CCD. Não é preciso ser a Y&R para fazer propaganda ruim, não. Ela pode ser feita em qualquer quartinho. E certamente está sendo feita.
Por isso as redes de varejo de todo tamanho e de todo lugar repetem o modelo "Casas Bahia", gerando um ruído ensurdecedor no horário comercial da TV aberta. Não é de admirar que todos estão fugindo da TV para se encontrar na internet e em suas variáveis sempre novas.
Aliás, o barulho só não é total porque há uma exceção. A rede de varejo que eu atendo, o Grupo Formosa. Seguindo a linha de seu fundador, José Oliveira, o grupo parte da lógica de que, quando todo mundo grita, só será ouvido quem falar mais baixo.
Com apenas duas lojas e fazendo propaganda clean, vendendo conceito, o Formosa tornou-se um dos maiores grupos de varejo do país. Sem grito.