terça-feira, julho 06, 2010

Um tom conhecido

É impressionante o tom que vem sendo usado pela imprensa para tratar Dunga, o treinador da seleção brasileira. Há um deboche, uma raiva não contida, uma evidente vontade de incitar o povo contra o treinador e contra a própria seleção. Isso não ocorreu antes. Não ocorreu, por exemplo, em 2006, quando a impressão geral era de desinteresse dos jogadores pelo rumo da seleção.
II
Mas há mais um aspecto: a Sportv publicou um matéria de tal maneira desrespeitosa em relação ao Paraguai, a pretexto de falar sobre sua seleção de futebol, que foi obrigada a se retratar dois dias após. A matéria era de extremo mau gosto, provocativa, debochada, estúpida. Uma agressão gratuita a nossos vizinhos, a gente com quem convivemos muito bem há muitos anos.
III
São dois os fatos, portanto: o primeiro, o tom em relação a Dunga e à seleção, muito superior ao usado em 2006. O segundo, a matéria de baixíssimo nível feita contra o Paraguai.

IV
Refleti sobre isso e me dei conta do que efetivamente ocorreu. Esse tom jocoso, desrespeitoso, debochado, irônico, superior, sarcástico, é exatamente o que vem sendo utilizado pela imprensa contra o Presidente Lula. A cada momento a imprensa faz questão de vincular a imagem de Lula a qualquer coisa negativa ou de pobre, como cachaça, por exemplo. Durante a copa, por exemplo, um grupo de assessores do Presidente resolveu, por mera brincadeira de um momento de euforia, apostar uma garrafa da – dizem – excelente cachaça fabricada pelo Vice-Presidente José Alencar. A curiosidade é que, segundo divulgado, o Vice-Presidente teria sido apenas comunicado que seria o fornecedor do brinde. A manchete estampada em alguns informativos foi vinculando Lula à Cachaça.

V
Há um amontoado de críticas que provavelmente fariam corar os racistas da África do Sul quando estavam no poder. São as expressões como “o sem dedo”, ou “o analfabeto”, que esse tipo de gente não tem coragem e nem condições de utilizar em público. Falam à boca pequena, ironizam nos seus pseudo-refinados meios. É o mesmo que fez Boris Casoy quando, ao final do ano passado, criticou os garis que se atreveram a desejar final ano novo a todos. Boris dizia: “era só o que faltava, o que há de mais baixo na sociedade desejando feliz ano novo”. Ou seja, uma visão escravista, de humilhação do ser humano.

VI
Aquela visão de Boris Casoy é exatamente a visão que alimenta esse tipo de comentário feito contra o Presidente da República. Agora mesmo, à noite, o Jornal Nacional critica a visita de Lula a um país africano porque há uma ditadura no poder há 31 anos. Ora, então o Jornal Nacional critica visitas de Obama à China? O Jornal Nacional critica visitas de Obama à Arábia Saudita? É evidente que não, mas tudo é vendido como se fosse uma imensa gafe. Quem entende de boa educação, quem entende de etiqueta, quem entende de diplomacia, quem entende de finesse, pois, é o Jornal Nacional, é a grande imprensa. Eles é que podem dizer o que é certo e o que é errado, com quais países o Brasil pode manter relações diplomáticas, quem pode ou não jogar na seleção brasileira.

VII
Friso, primeiro, que quando da visita da seleção ao Presidente da República, na ida para África, Dunga fez questão de demonstrar seu azedume em relação a Lula, cumprimentando-o visivelmente a contragosto. Ou seja, não há nada em comum entre Dunga e Lula. A questão é outra: é que o ódio mal dissimulado, esse tom de deboche permanente, é exatamente o tom usado pela grande imprensa contra os seus desafetos.

VIII
É ali que emerge a soberba, o sentimento de superioridade. O tom que vem sendo usado contra a seleção e contra Dunga , o tom que foi utilizado contra o Paraguai – sim, o país Paraguai, e não a seleção paraguaia – é exatamente o mesmo tom que a grande imprensa usa contra Lula.

IX
Concluo, pois: o uso permanente desse tom desrepeitoso contra alguém que esses meios de comunicação consideram “inferior”, agora teve as comportas arrombadas. Passaram a utilizar esse tom contra a seleção, contra Dunga, e agora contra o Paraguai. Pode observar. É exatamente o mesmo tom, a mesma arrogância, o mesmo ódio mal disfarçado, a mesma prepotência, o mesmo deboche, a mesma ironia, o mesmo preconceito.


Por Castagna Maia