Com a falta de modéstia que lhe é peculiar, Washington Olivetto, o dono da poderosa agência WBrasil, está de volta à sua modalidade predileta de meta-existência: a super exposição na mídia, a invenção de histórias sobre si mesmo e a auto-construção de pautas positivas.
Em 2000, o publicitário disse para quem queria ouvir e para quem não estava nem aí para ele, que sua escolha como "publicitário do século" pela Associação Latino-americana de Publicidade e por uma enquete na Internet feita por profissionais do ramo foi mais do que merecida, arrematando com a frase: "Ganhar publicitário do século é fácil, ver o Corinthians ser campeão mundial de futebol, isso sim é relevante".
Inteligente, falante, fluente e influente, Olivetto ostenta pouco mais que 1,55 m de altura, mas é um dos grandes do meio, sendo um dos publicitários mais festejados do mundo - só no Festival de Cannes foi premiado 46 vezes.
Indubitavelmente, o brilhante dono da WBrasil é o inventor de um modelo de publicitário, aquele que brilha mais que suas campanhas. E teve seguidores, com destaque para Duda Mendonça, que deu mais entrevistas entre 2002 e 2004 que o próprio presidente Lula, fazendo muita gente crer que o mais importante líder sindical da nossa história e fundador do mais importante partido de esquerda do Ocidente havia sido "fabricado" por ele. Muita gente está disposta a acreditar em coisas inacreditáveis e disso vale-se o embusteiro, tenha ele na mão uma Bíblia, um mandato, um canal de TV ou apenas um comercial de 30 segundos.
É o próprio Olivetto quem explica seu método de construção de imagem: "Fui o primeiro publicitário a dar valor à exposição na mídia de maneira consistente e exaustiva. Tenho necessidade de estar na mídia o tempo todo, mas piloto para que seja o profissional, não o pessoal. Vou a todas as exposições mas não a vernissages, vou a todos os shows, nunca na estréia. Talvez isso explique minha visibilidade há 30 anos. Mas meus anunciantes estão o tempo todo nos veículos que cultuam celebridades. Se eu gravasse disco ou trabalhasse em novela, investiria nisso".
Já gravou disco, na verdade. A canção em que Jorge Benjor repete insistentemente a frase "Alô, Alô dabliú Brasil" é, na verdade, um jingle da agência de WO que, com reiteradas audições radiofônicas, forçosamente adentrou no cancioneio popular brasileiro - ainda que aquela lenga-lenga de duas notas tocadas toscamente por Benjor não possa, seriamente, ser chamada de música. É musak terceiromundista.
Ótimo contador de histórias, Olivetto inventou de si mesmo (seu principal personagem e sua marca mais querida) e repetiu mil e uma vezes uma história fantástica de que teria entrado na publicidade por acaso: "ia para uma das duas faculdades que fazia em São Paulo (e que não terminei). O pneu do carro furou onde havia uma pequena agência de publicidade chamada HGP. Eu era ruim para trocar pneus e então resolvi pedir um estágio. Disse ao dono da agência que tinha furado o pneu e que o meu pneu não furava duas vezes na mesma rua. Portanto, que ele devia me dar uma oportunidade porque senão era ele quem perderia a oportunidade. O sujeito achou engraçado e me deu uma chance. Tinha 18 anos."
Nenhum adulto, no pleno domínio de suas faculdades mentais, pode acreditar nessa bobagem, de um primarismo lógico exemplar, mas a imprensa nacional teima em reproduzir essa fantasia autoproclamatória como se fosse a realidade dos fatos. É por isso que vivemos em um mundo, como disse Carl Sagan, "assombrado por monstros e demônios".
Olivetto, enfadonhamente ególatra, aproveita-se da credulidade humana para avançar nas fantasias que constituem sua autobiografia.
Com uma boa agência montada em contas expressivas, um nome solidamente implantado no imaginário do negócio da comunicação, o empresário dedica-se agora a revigorar seu ego contando mais uma lorota que quer ver ganhar ares de verdade. E deve conseguir.
Afinal, como dizia Goebbels, uma lorota contada mil vezes ganha ares de verdade. E começa, às vezes, a parecer verdade. Especialmente se conta para isso com a boa vontade irrestrita da grande imprensa.
Na edição da revista Época de 22 de setembro de 2008, por exemplo, Olivetto supera-se e atribui a si mesmo simplesmente a "autoria"... de um ditado popular brasileiro que tem o tempo de existência da própria língua portuguesa moderna: "o primeiro... a gente nunca esquece". Cabem aqui palavras infindas: beijo, amor (nos vários sentidos da palavra), filho, namorado, namorada, marido, livro, carro, apartamento, emprego, etc, etc.
Tomada da cultura de massas e usada brilhantemente em uma campanha de sutiãs criada na década de oitenta pelo próprio Olivetto, a frase é na verdade de uso corrente, aquilo que chamamos comumente de "ditado" ou "adágio" popular. O mérito de Olivetto não foi o de "criar" a frase que já estava criada, mas de colocá-la no contexto do produto que pretendia vender.
Mas eis que Olivetto, inconformado com o limite que a realidade impõe, chama para si nada menos que a autoria da frase que faz parte do senso comum nacional. "O sentimento de afeto às primeiras coisas sempre existiu", admite ele no release publicado por Época. Contudo, vai além: "mas não essa formulação: "o primeiro a gente nunca esquece", que entrou para a cultura popular". Assim é, se lhe parece.
Como aqueles cantores e compositores extremamente talentosos que fizeram muito sucesso aos vinte e pouco anos e vivem hoje da reedição incessante de coletâneas com suas velhas canções, Olivetto está embriagado de nostalgia. E perdendo velozmente o senso de realidade.