sexta-feira, setembro 26, 2008

Política, comunicação e persuasão

A palavra serve para exprimir ou comunicar uma idéia, um sentimento, um desejo, uma vontade, um conteúdo. Serve para explicar e para entender. Pode ser a lupa que descortina o conhecimento, a chave que abre portas e masmorras ou, como disse o poeta, o estilete dilacerador. A palavra é vida e é morte. A palavra é o signo que transporta o sentimento do mundo.
A arte de convencer pela palavra é muito antiga. Em sua forma moderna, a propaganda política foi inaugurada pelo bolchevismo, e especialmente por Lênin, o organizador, e Trotski, o intelectual que esgrimia a palavra como poucos.
Mas mesmo antes deles houve líderes que reconheceram sua importância. Napoleão Bonaparte foi um desses sábios guerreiros. Ele disse: "Para ser justo, não é suficiente fazer o bem, é igualmente necessário que os administrados estejam convencidos. A força fundamenta-se na opinião. Que é o governo? Nada, se não dispuser da opinião pública."
Mas foram Hitler e Goebbels que utilizaram com maior sucesso as técnicas de controle da opinião pública e, assim, acabaram dando enorme contribuição à propaganda moderna. Os fundamentos do que fizeram, teorizaram e formularam estão na base do marketing atual e da teoria do Posicionamento, a mais bem desenvolvida teoria de persuasão através do marketing e da publicidade, formulada por Jack Trout e All Ries.
Mas o que é propaganda? "A propaganda é uma tentativa de influenciar a opinião e a conduta da sociedade, de tal modo que as pessoas adotem uma conduta determinada", escreveu Bartlett, em Political propaganda. E qual a diferença, então, entre propaganda e publicidade? Jean-Marie Domenach, em seu clássico livro “A propaganda política”, responde: "A publicidade suscita necessidades ou preferências visando a determinado produto particular, enquanto a propaganda sugere ou impõe crenças e reflexos que, amiúde, modificam o comportamento, o psiquismo e mesmo as convicções religiosas ou filosóficas."
Pesquisa de opinião pública encomendada pelo Ministério da Justiça e pela Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) ao Ibope mostrou que, para 30% dos pesquisados, a televisão é o principal veículo informativo e, para muitos, 28%, formativo. Ela é avaliada como uma importante fonte de atualização de conhecimentos e de entretenimento. No entanto, a maioria dos entrevistados, 57%, afirmou não se preocupar com o conteúdo da programação televisiva.
Poder de influenciar somado ao desinteresse pelo conteúdo dos programas. Eis aí a fórmula ideal para o controle da opinião pública.
A partir do momento em que se percebeu que o homem médio é um ser essencialmente influenciável, e que é possível mudar-lhe as opiniões e as idéias, os especialistas passaram a utilizar em matéria política o que já se verificara viável do ponto de vista comercial.
Assim, as campanhas eleitorais nos EUA – com suas "paradas", orquestras, girls e cartazes, que são um verdadeiro e ruidoso reclame – pouco diferem das campanhas publicitárias comerciais. Se você vai ao YouTube e digita "ad" (de "advertising") e o nome do candidato, verá centenas de peças de vídeo, oficiais e oficiosas, que usam os elementos presentes na publicidade comercial de qualquer produto.
"Os poderes destrutivos contidos nos sentimentos e ressentimentos humanos podem ser utilizados, manipulados por especialistas", disse J. Monnerot. E para isso são utilizadas leis específicas: as leis da propaganda ou da comunicação política. Já as publiquei aqui, mas penso que a conjuntura eleitoral exige que voltemos a elas, relancionando-as, inclusive, com as ações de marketing comercial, que ao longo do século XX foi se apropriando paulatinamente das ferramentas da comunicação política, transformando-as em eficientes mecanismos de abertura e manutenção de mercado.

Lei da Simplificação e do Inimigo Único

Consiste em concentrar sobre uma única pessoa as esperanças do campo a que se pertence ou o ódio pelo campo adverso. Reduzir a luta política, por exemplo, à rivalidade entre pessoas é substituir a difícil confrontação de teses. No caso do nazismo, os comunistas e judeus acabaram eleitos como "inimigo único" (usavam como exemplo Marx e Trotski, ambos judeus e comunistas); para os estadunidenses, eram os “comunistas” ao longo da Guerra Fria e hoje são os “terroristas”, um eufemismo para nominar os muçulmanos fundamentalistas, ou os "narco-guerrilheiros", outro neologismo, agora usado para desqualificar os movimentos de resistência armada ainda existentes na América Latina. Aliás, sobre a guerra suja anti-comunista nem tudo ainda veio à tona. Em 2001, a publicação de um livro de história que revelava o envolvimento dos EUA na morte de mais de 100 mil comunistas indonésios foi bloqueada pelo governo do presidente George W. Bush.
O livro, produzido com base a relatórios do Departamento de Estado, detalhava as atividades diplomáticas e de inteligência dos EUA na Indonésia entre 1965 e 1966. Ele mostrava que, durante uma ação sangrenta contra os comunistas, a Embaixada dos EUA em Jacarta forneceu às forças indonésias uma lista com nomes de líderes do PKI, o Partido Comunista Indonésio. A publicação também sugeria que o serviço secreto americano tenha contribuído para o assassinato de mais de 100 mil membros do PKI. Um exemplar foi obtido pelo Arquivo de Segurança Nacional, um instituto de pesquisa que luta pela publicação de documentos oficiais que deixaram de ser confidenciais, depois que o livro foi enviado a livrarias do governo acidentalmente. Segundo o arquivo, o livro diz que, em dezembro de 1965, Marshall Green, então embaixador dos EUA em Jacarta, ‘endossou um pagamento secreto de cerca de US$ 5.000 ao Kap-Gestapu, o movimento que liderava a repressão na Indonésia’.
A grande imprensa silenciou sobre os fatos e sobre os relatos.


Lei da Ampliação e Desfiguração

A ampliação exagerada das notícias é um processo jornalístico empregado correntemente pela imprensa, que coloca em evidência todas as informações favoráveis aos seus objetivos e omite os elementos estruturais do argumento contrário. A permanente campanha da imprensa contra o governo Lula, por exemplo, tenta jogar na conta do líder petista todas as crises que acontecem no país, incluindo a "crise aérea" fabricada pela greve dos controladores de vôo em busca de elevação salarial ou a crise separatista boliviana, que agrupa governadores contrários a Evo Morales, o índio presidente do país vizinho. Nesse caso, a imprensa alardeou uma crise de falta de gás de cozinha no Brasil, que não aconteceu, para em seguida falar em soberania nacional "em defesa" das ações da Petrobrás, que devem ser regidas por interesses comerciais, já que trata-se de uma empresa, e não de sentimentos patrióticos canalhas e oportunistas.

Lei da Orquestração

A primeira condição para uma boa propaganda é a infatigável repetição dos temas principais. Goebbels dizia: "A Igreja Católica mantém-se porque repete a mesma coisa há dois mil anos. O Estado nacional-socialista deve agir analogamente."
Adolf Hitler, em seu Mein Kampf, escreveu: "A propaganda deve limitar-se a pequeno número de idéias e repeti-las incansavelmente. As massas não se lembrarão das idéias mais simples a menos que sejam repetidas centenas de vezes. As alterações nela introduzidas não devem jamais prejudicar o fundo dos ensinamentos a cuja difusão nos propomos, mas apenas a forma. A palavra de ordem deve ser apresentada sob diferentes aspectos, embora sempre figurando, condensada, numa fórmula invariável, à maneira de conclusão.
Portanto, a qualidade fundamental de toda campanha de propaganda é a permanência do tema, aliada à variedade de apresentação.

Lei da Transfusão

A propaganda não se faz do nada e se impõe às massas. Ela sempre age, em geral, sobre um substrato preexistente, seja uma mitologia nacional, seja o simples complexo de ódios e de preconceitos tradicionais. É o que os oradores fazem quando querem amoldar uma multidão ao seu objetivo: jamais contradizem as pessoas frontalmente, mas de início declaram-se de acordo com ela.
A maior preocupação dos estrategistas (que os bolheviques chamavam de "propagandistas") reside na identificação e na exploração do gosto popular, mesmo naquilo que tem de mais perturbador e absurdo.

Lei da Unanimidade

Baseia-se no fato de que inúmeras opiniões não passam, na realidade, de uma soma de conformismos, e se mantêm apenas por ter o indivíduo as impressões de que a sua opinião é espossada unanimemente por todos no seu meio. É tarefa da propaganda reforçar essa unanimidade e mesmo criá-la artificialmente. Em marketing comercial isso se chama "formação de fidelidade". Desde suas origens, as ações empreendidas pela Coca-Cola Company contribuiram para criar em torno de sua marca um alto indice de envolvimento e comprometimento do consumidor. E fez isso explorando convenientemente os valores mais predominantes na sociedade estadunidense e estabelecer profundas ligações da marca com quase todos os aspects de sua vida. Esse modelo aprofundou-se com a mundialização da marca, que passou a adaptar-se aos elementos que são universalmente entendidos como frescor, bem estar e felicidade.