Uma nova ciência, baseada na linguagem e na percepção, está tomando corpo. Esse saber, chamado de memética, aos poucos têm se disseminado, com seu aparato de novas palavras, pela Internet.
O conceito básico é que palavras, idéias, são vistas como vírus, potentes contaminadores de significados que podem ser espalhados instantâneamente e que se auto-replicam na medida em que são comunicados. O termo meme apareceu pela primeira vez no livro “ O Gene Egoísta”, de Richard Dawkins, conceituado estudioso de botânica. Nele Dawkins define o meme como um equivalente mental do gene, que reteria as informações psicológicas básicas do ser humano e que funcionaria pela imitação e com a capacidade de replicação. Os memes, nesse caso, reteriam as informações básicas da espécie e estariam relacionadas aos mecanismos de sobrevivência.
A definição inicial, no entanto, tem sido paulatinamente incrementada e ampliada. Há cada vez mais estudiosos de memes, cursos voltados para essa disciplina, e já chega a fazer parte de currículos acadêmicos. A memética tem se voltado para entender os mecanismos de formação de opiniões, de transmissão de informações, de criação de novos conceitos. Daí sua aplicabilidade a estudos dos meios de comunicação, da mídia, da publicidade, da moda, e, é claro, da própria internet. Há vários livros que já saíram, em inglês, sobre o assunto e é enorme a quantidade de sites sobre memes. A premissa fundamental de que um slogan, uma frase, uma palavra, uma idéia, um estilo, um termo, podem ser um meme, é o que conta.
O enfoque da memética, em muitos casos, tem tido um mero víes comportamental. Volta-se, em geral, para os hábitos repetidos e lugares comuns, chavões sociais passados pelas instituições ou pela própria família, de pai para filho, ou, numa empresa, de patrão para empregado.
Mas essa é só a ponta do iceberg. A subversão do conceito de meme tem sido igualmente explorada, chegando a ser proposto que se hackeie memes. A coisa evoluiu de tal forma que um mote já antigo, o da linguagem como vírus, está sendo reutilizado pelos estudiosos dos memes. A metáfora do vírus, que vocês já devem conhecer da famosa música de Laurie Anderson, “Language is a vírus”, vem por sua vez do escritor beat William Burroughs, que acreditava que somos todos controlados pela mídia e meios de comunicação e que a única forma de escapar a esse controle era emitindo, criando vírus de linguagem, coisa que ele fazia através de sua experiências com os cut-ups. Burroughs cutapeava os textos de jornais e revistas recortando-os em pedacinhos e colando-os ao acaso para daí extrair novas mensagens, reconfigurações de significados. Da mesma forma, aplicaria isso a tapes, gravando conversas, músicas, sons de rua, de bares, de vários locais e misturando tudo para obter novos efeitos, que explicará detalhadamente em A Revolução Eletrônica. A noção de vírus cai direitinho no conceito de disseminação dos memes, e mais ainda nos anti-memes ou memes hackeados.
A abordagem viral do meme não podia ser mais atual, nessa nossa época de AIDS e vírus de computador, e é sob esse aspecto que os memes tem sido utilizados por grupos undergrounds como os zippies e os culture jammers. Os primeiros, freaks cibernéticos ou cyberhippies, se autoproclamam eles mesmos um novo meme e pretendem lançar cada vez mais novos memes, unindo conceitos de tecnologia e misticismo, filosofia DIY (faça-você-mesmo) e psicodelia pela rede e pelo submundo eletrônico das raves. Já os culture jammers querem a implosão semiótica do sistema capitalista e sua mídia. Para tanto sua estratégia é a paródia, o plágio alterado (ou deturrnamento, desvio), a interferência, o ruído. Essas estratégias de assalto e sabotagem da mídia subvertem os memes propagados pela publicidade e programas de tevê e seu objetivo primordial é modificar a visão passiva que temos e absorvemos dessas mídias. Historicamente falando, um pouco do que os dadaístas, situacionistas e punks vêm fazendo ao longo do século.
Agora que você já sabe o que são memes, cuidado. Este é um meta-meme. Ele já está na sua cabeça. Espalhe-o por aí.
Por Ricardo Rosas