Do mesmo modo que os comerciais de cigarros foram proibidos e a propaganda de cigarro e seus rótulos passaram a ter uma frase de advertência que alerta o consumidor para o malefício de consumir aquele produto, o estímulo ao consumo do álcool deveria ser coibido com limitações rigorosas à sua comunicação de marketing (como a restrição de horário para a exibição de comerciais que estimulam o uso da droga), obrigatoriedade de advertência ao consumidor e sobre-taxas tributárias que ajudassem a custear o tratamento das vítimas diretas e indiretas da ingestão de bebidas. Ao contrário, a mídia escancarada que estimula jovens a partir dos 13 anos a consumir esse entorpecente líquido é tão eficiente que a produção de cerveja no Brasil superou todas as expectativas e alcançou em 2010 a marca recorde de 12,6 bilhões de litros, um crescimento de 18% em relação a 2009, crescendo mais do que o dobro do PIB.
Com esse resultado, o Brasil se tornou no ano passado o terceiro maior mercado de cerveja do mundo, atrás apenas da China, com produção na faixa de 40 bilhões de litros, e EUA, com 35 bilhões de litros.
Num ano só, o Brasil deixou para trás gigantes como Rússia e Alemanha.
Os números são do Sindicerv (Sindicato Nacional de Cerveja) e devem ser divulgados nos próximos dias.
Segundo Gilmar Viana, presidente do Sindicerv, esse resultado se deve a três fatores. Em primeiro lugar, ao crescimento da renda, depois à estabilidade dos preços, e, em terceiro, ao clima favorável no país ao consumo de cerveja.
No mesmo período, cresceu em igual proporção o número de acidentes de trânsito fatais ou imobilizantes, as moléstias mentais desencadeadas em função do consumo de bebidas alcoólicas e os homicídios violentos.
É verdade que toda a história da humanidade está permeada pelo consumo de álcool. Registros arqueológicos revelam que os primeiros indícios sobre o consumo de álcool pelo ser humano data de aproximadamente 6000 a.C., sendo, portanto, um costume extremamente antigo e que tem persistido por milhares de anos, o que não quer dizer que seja benéfico em nenhum aspecto. A abusiva propaganda de bebida no Brasil associada a um potente lobby da indústria do vinho – que enganosamente é visto como “benéfico” - a noção de álcool como uma substância divina, por exemplo, pode ser encontrada em inúmeros exemplos na mitologia, sendo talvez um dos fatores responsáveis pela manutenção do hábito de beber ao longo do tempo. Inicialmente, as bebidas tinham conteúdo alcoólico relativamente baixo, como por exemplo, o vinho e a cerveja, já que dependiam exclusivamente do processo de fermentação. Com o advento do processo de destilação, introduzido na Europa pelos árabes na Idade Média, surgiram novos tipos de bebidas alcoólicas, que passaram a ser utilizadas na sua forma destilada. Nesta época, este tipo de bebida passou a ser considerado como um remédio para todas as doenças, pois “dissipavam as preocupações mais rapidamente do que o vinho e a cerveja, além de produzirem um alívio mais eficiente da dor”, surgindo então a palavra whisky (do gálico usquebaugh, que significa “água da vida”). A partir da Revolução Industrial, registrou-se um grande aumento na oferta deste tipo de bebida, contribuindo para um maior consumo e, conseqüentemente, gerando um aumento no número de pessoas que passaram a apresentar algum tipo de problema devido ao uso excessivo de álcool.
Apesar do consumo legal e estimulado em larga escala, o álcool também é considerado uma droga psicotrópica, pois ele atua no sistema nervoso central, provocando uma mudança no comportamento de quem o consome, além de ter potencial para desenvolver dependência mesmo em pequenas quantidades.
Baseado em uma indústria milionária e poderosa, o álcool é uma das poucas drogas psicotrópicas que tem seu consumo admitido e até incentivado pela sociedade. Esse é um dos motivos pelo qual ele é encarado de forma diferenciada, quando comparado com as demais drogas. Apesar de sua ampla aceitação social, o consumo de bebidas alcoólicas é um problema não apenas de saúde pública, mas também econômico. Gerando lucros extraordinário para a indústria que o produz e distribui, o álcool gera prejuízos enormes para a sociedade e para as contas públicas porque incrementa o gasto em saúde pública, elevando o índice de internações, de óbito de jovens e mulheres e de surgimento de moléstias mentais associadas. Além de causar cirrose, esteatose, gastrite, impotência sexual e hipertensão, problemas relacionados ao consumo de bebida estão também no topo das causas de acidentes de trabalho.
A dependência do álcool é uma condição frequente, atingindo cerca de 5 a 10% da população adulta brasileira.
Não existe o "beber moderado", como pensam alguns, porque a distinção entre esse quadro e o beber "problemático" ocorre de maneira diferenciada em cada indivíduo e em geral transcorre de forma lenta. Alguns dos sinais que surgem no decorrer da vida de quem bebe "socialmente" com freqüência: desenvolvimento da tolerância, ou seja, a necessidade de beber cada vez maiores quantidades de álcool para obter os mesmos efeitos; o aumento da importância do álcool na vida da pessoa; a percepção do “grande desejo” de beber e da falta de controle em relação a quando parar; síndrome de abstinência (aparecimento de sintomas desagradáveis após ter ficado algumas horas sem beber) e o aumento da ingestão de álcool para aliviar a síndrome de abstinência.
A síndrome de abstinência do álcool é um quadro que aparece pela redução ou parada brusca da ingestão de bebidas alcoólicas após um período de consumo crónico. A síndrome tem início 6-8 horas após a parada da ingestão de álcool, sendo caracterizada pelo tremor das mãos, acompanhado de distúrbios gastrointestinais, distúrbios de sono e um estado de inquietação geral (abstinência leve). Cerca de 5% dos que entram em abstinência leve evoluem para a síndrome de abstinência severa ou delirium tremens que, além da acentuação dos sinais e sintomas acima referidos, caracteriza-se por tremores generalizados, agitação intensa e desorientação no tempo e espaço.
Onde está o congresso nacional, que permite que essa droga continue a ser consumida sob o estímulo de propaganda legal, postos legais de distribuição e incentivo fiscal? Provavelmente, está tomando uma dose para comemorar o resultado do crescimento recorde na venda desse veneno líquido para os brasileiros. Saúde, Brasil!