segunda-feira, maio 17, 2010

Como funciona o sistema de governo inglês

O sistema de governo no Brasil é uma teia de erros. A partir dele, cria-se uma armadilha institucional que retroalimenta as piores práticas políticas, como aquelas recentemente ilustradas no chamado "Mensalão do DEM de Brasília", onde, de acordo com denúncia do Ministério Público, o governo do Distrito Federal obtinha maioria no parlamento e estabilidade institucional a partir de métodos fisiológicos, e não da força dos argumentos.
Longe de defender atos lesivos, precisamos entender que, no nosso sistema, o executivo é refém do legislativo. Não é um exemplo de formato democrático, embora o costume nos faça interpretar como "certo" o sistema do jeito que é. O governo do Pará mendigar por seis longos meses pela autorizaçao do legislativo estadual para obter um empréstimo para obras estruturais importantes é outro exemplo da estupidez de um sistema que elege governadores e presidentes mas não garante a eles os instrumentos de autonomia que o poder precisaria ter para fazer valer a vontade da maioria que colocou na cadeira de principal mandatário este candidato e não outro.
A solidez democrática do sistema inglês pode nos ajudar a ler criticamente nosso próprio modelo. A base da democracia inglesa é a Carta Magna, redigida em 1215, quando o Brasil estava longe de ser descoberto. O documento e a prática que dele advém podem, quem sabe, jogar luz sobre a necessidade de mudanças substatitivas em nosso próprio modelo.
A Carta Magna foi a primeira constituiçao que se conhece e está na raiz da estabilidade institucional do Reino Unido.
A sólida democracia inglesa funciona bem sem a separaçao de poderes. Todos os ministros têm de ser membros do parlamento, formado pela Câmara dos Comuns (eleitos) e pela Câmara dos Lordes (indicados). O Gabinete, o Poder Executivo, é um comitê da Câmara dos Comuns. Até o ano passado, quando foi criada uma Suprema Corte, um Comitê dos Lordes era o órgão máximo da Justiça.
Ao contrário do que tenta fazer crer a frase "fulano vai ser uma rainha da Inglaterra", a monarquia não é meramente figurativa no sistema político inglês. O monarca chefia o Estado e é quem aprova a indicação do primeiro ministro feita pelos Comuns. Desde o fim do século XIX o monarca passou a ter três direitos - o direito de ser consultado, o direito de aconselhar e o direito de advertir.
Não existem governadores. Toda política é feita pelos Comuns.
No sistema distrital inglês quem ganha no distrito carrega todos os votos. Ou seja, todos os votos dados ao perdedor em um distrito são ignorados. Esse modo de votaçao não foi feito para garantir proporcionalidade - que o número de deputados de cada partido seja proporcional ao número de votos recebidos. O sistema se propõe a produzir governos estáveis, com maioria nos Comuns. Isso faz com que os governantes não sejam reféns do legislativo. A vontade da maioria se impõe enquanto maioria. Ou seja, todos têm direito a expressar sua opinião e apresentar propostas, mas uma vez constituida a maioria, ela governo como maioria, deixando a liberdade de opinião e critica aberta, mas constituindo governos coesos, de cor partidária evidente.
Esse modelo evitaria o loteamento de cargos, as barganhas por dentro do congresso e as práticas recorrentes de obtençao fisiológica de uma maioria instável.
Mas como aplicar um modelo que os séculos consolidaram em um país que muda as regras eleitorais a cada pleito? Como aplicar um método de constituiçao de maioria com base na vontade da maioria quando o congresso sequer consegue impedir que marginais se candidatem a cargos eletivos?
O Brasil de 2010 precisa olhar para a Grã-Bretanha de 1215 com olhos de quem quer não apenas vislumbrar as diferenças, mas aprender com elas.